segunda-feira, 7 de julho de 2008

Anorgasmia


Ainda ontem, fui atraída pela capa de uma revista que estampava uma linda e elegante celebridade norte-americana com dois seios siliconizados sob a camiseta branca. Depois de sair do transe hipnótico ao qual seu olhar mortífero havia me submetido, tentei ler as manchetes do que viria adiante, mas o nome da revista, escrito em um vermelho metálico vibrava tanto, que eu passei mais um tempinho brincando de movimentar a revista na luz, a fim de jogar com aquele efeito. Logo embaixo daquelas letras divertidas, eis que me deparo com a seguinte chamada: "Orgasmo, garanta já o seu!!!" Parei ali e fiquei um tempinho pensando, não sabia que já estavam vendendo orgasmos no mercado... Corri as páginas até o editorial, e lá estava uma bonequinha de plástico nua deitada de bruços, e mais garantias: "... Se for o caso, prolongue". Fui então, curiosa, até a página 74, e ressentido foi o meu desapontamento ao confirmar mais umas dessas chatas reportagens com entrevistas curtas a sexólogas histéricas. Broxante. Por um momento imaginei orgasmos em compota nas prateleiras, em vez de orientações previsíveis. Terapia em grupo, auto-conhecimento, com indicações a determinadíssimos especialistas, livros, páginas eletrônicas, filmes e brinquedinhos eróticos... A matéria vendia tudo, menos orgasmo garantido. Fechei a revista e voltei para a capa. Passei mais uns segundos admirando a sedutora atriz e as letras do título da revista, e voltei finalmente às outras chamadas, dessa vez com a motivação de uma lesma frígida. Mas o mal-estar passou logo que li a outra manchete: "As novas coleções - 363 peças que vale a pena comprar!!" Com o perdão da má-palavra, que besta consumidora da tal revisteca poderia comprar 365 peças de uma vez?! Como se não bastasse, o preço de cada uma delas era simplesmente pornográfico! Ofereciam camiseta de malha por 320 reais, botas de 1.270, óculos de 440, sandálias, 893, mocassim por 1.167, macaquinho jeans, 820, 1.200, suéter por 1.180 e vestidinho, 1.900, meia-calça, 547, lenço de 250... e por aí continuava até dar as benditas 365 peças. Como se vê, temos a opção de comprar uma revista, pela bagatela simplória de cinco reais, que diz com o que e como devem gastar o dinheiro que, na verdade, suas leitoras não tem. É claro que tudo naquela publicação conduzia a um mundo fantástico de ofertas inatingíveis, como as dicas da maior maquiadora do mundo e coisas do gênero. Como ainda acredito um tiquinho na humanidade, preferi imaginar que nenhuma mulher, depois de ler a revista, corresse para a custosa terapia de grupo indicada a fim de estimular os prazeres do sexo (e o mercado da simulação). Ou então, que desejasse as três centenas de roupas e sapatos em oferta, de uma só vez. Falando em desejo, as consumistas à beira de um piripaque, se acharem que vale a pena um terço daqueles produtos, terão que desembolsar 50 mil, no mínimo, até a próxima estação. E provavelmente vão continuar sem orgasmos. Cá pra nós, é por isso que eu digo, se orgasmo vendesse no mercado, não se gastaria tanto, mentira?!


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